Israel envenenou terra palestina para construir colonato na Cisjordânia
Uma investigação da Universidade de Nova Iorque, citada pelo diário israelita Haaretz, revela como o exército de Israel não hesitou em recorrer ao envenenamento de culturas e animais para expulsar os proprietários palestinos e se apossar das suas terras para construção de colonatos.
A investigação foi conduzida pelo Taub Center for Israel Studies da Universidade de Nova Iorque, que teve acesso a documentos de arquivo, entretanto tornados públicos.
O método utilizado para a instalação de colonatos nos primeiros anos da expansão colonial é descrito em detalhe.
O primeiro passo era despojar os habitantes de uma aldeia palestina vizinha das suas terras com o falso pretexto de estabelecer ali uma zona de treino militar. Se os palestinos insistissem em cultivar as suas terras, os soldados israelitas sabotavam as suas alfaias agrícolas e, mais tarde, usavam os seus veículos para destruir as colheitas.
Se tudo isto falhasse, recorriam à solução radical de pulverizar as culturas com uma substância tóxica que era letal para os animais e perigosa para os humanos.
O processo está detalhadamente descrito no que respeita à instalação do colonato de Gitit em terras roubadas à vila de Aqraba.
Em Janeiro de 1972 foram dadas ordens à Brigada do Vale do Jordão para que nenhuma terra fosse cultivada. Como isso não resultou, em Março foram convocados os chefes da vila para os intimar a cumprir as ordens ou as suas culturas seriam destruídas e eles seriam acusados de entrar ilegalmente numa zona militar.
Um documento refere que um oficial e vários soldados danificaram um tractor e alfaias pertencentes a palestinos.
Em Abril de 1972 realizou-se uma reunião no comando central do exército israelita (IDF) para decidir responsabilidades e calendário para a pulverização avisando que, durante três dias, ninguém deveria entrar na área e os animais deveriam ficar de fora por mais uma semana. A operação foi realizada em 17 de Abril.
Os arquivos guardam uma carta do presidente da câmara de Aqraba para o ministro da Defesa Moshe Dayan: «A nossa vila tem 4000 habitantes que cultivam 145 000 dunams [14 500 hectares] de terras agrícolas». A carta refere depois que, com as culturas destruídas e as terras confiscadas, aos palestinos só foram deixados 25 000 dunams. «Os danos são insuportáveis […] como é que nos vamos sustentar?», lamenta a carta, que prossegue: «vivemos num país democrático sem discriminação racial. Pedimos que cancelem o colonato nas nossas terras e nos permitam continuar a viver cultivando as nossas terras de acordo com o direito e a justiça».
Mas o apelo não foi atendido. Em Maio de 1973 os militares apropriaram-se da terra e estabeleceram ali um posto avançado que mais tarde se tornou no colonato de Gitit.
A base de dados criada pelo Taub Center com documentação referente ao estabelecimento dos colonatos contém mais de 11 000 ficheiros com cerca de milhão e meio de páginas.
Um dos documentos regista uma reunião do governo presidido por Golda Meir realizada em 19 de Janeiro de 1971 em que a primeira-ministra avisa os seus ministros: «Era nosso hábito que tudo o que tivesse que ver com colonatos, postos avançados, expropriação de terras, etc., nós simplesmente fazíamos e não falávamos. Ultimamente isso perdeu-se. Peço aos meus ministros, para bem da nossa pátria, para se conterem, falarem menos e fazerem o máximo possível».
O artigo do Haaretz relata ainda outras reuniões onde foi decidida a criação de outros colonatos, nomeadamente Ma’aleh Adumim que viria a ser protagonista do infame projecto do corredor E1 que visa ligá-lo a Jerusalém através de um contínuo de colonatos judaicos que, a concretizar-se, isola Jerusalém Oriental e separa o Norte do Sul da Cisjordânia.
O historiador Ronald W. Zwei, anterior responsável do Taub Center, declarou, referindo-se à base de dados agora constituída: «A análise deste material permite-nos compreender que este grande empreendimento nacional [o estabelecimento dos colonatos nos territórios ocupados] é o resultado da iniciativa de governos de Israel durante gerações. Não apenas de governos de direita, mas de todos eles».
Aqraba é hoje uma acolhedora vila palestina, com mais de 8000 habitantes, cuja economia é asfixiada pelos colonatos ilegais que a cercam. A taxa de desemprego é superior a 50%. São frequentes os ataques de colonos israelitas que vandalizam as culturas com a protecção do exército que não hesita em disparar sobre os habitantes palestinos que defendam as suas propriedades.
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Foto: Colonato ilegal de Gitit