Primeiro futebolista nascido na Palestina inscrito numa liga europeia de topo joga em Portugal

Oday Dabbagh, contratado esta época pelo FC Arouca, é o primeiro futebolista nascido e formado na Palestina a jogar numa das principais ligas europeias. Este é um momento histórico para o futebol palestino, uma vez que antes dele apenas o lateral-esquerdo Mohammed Saleh, natural de Gaza, tinha jogado na Europa, mas no Florian, de Malta.

«Claro que este é um grande sentimento e uma fonte de orgulho não só para mim mas para todos os palestinos», declarou Dabbagh ao periódico britânico Tribune. «Espero poder jogar bem e ser um embaixador dos jogadores palestinos.»

A história de Dabbagh é um símbolo de resistência a décadas de ocupação. Até chegar ao Arouca, vindo do Al-Arabi SC, do Koweit, onde ajudou o clube a conquistar o seu primeiro título em 20 anos e se sagrou o melhor marcador do campeonato, há um percurso de lesões e dos mais variados obstáculos, vencidos com muito querer e trabalho árduo.

Dabbagh começou a jogar à bola nos empedrados da Cidade Velha da sua Jerusalém natal, onde procurava emular o seu ídolo, o avançado neerlandês Robin van Persie.

Começou a sua carreira como sénior no Hilal Al-Quds que, com ele, ganhou três títulos consecutivos na Primeira Liga da Cisjordânia. Marcou 40 golos nesse período. Na selecção palestina sub-23 chegou aos quartos de final da Taça Asiática de 2018, na China.

A sua carreira internacional, antes de vir para Portugal, decorre toda no Koweit. Lesões e um teste positivo para o Covid 19 ensombraram o seu percurso no Al-Salmiya e no Al-Qadsiya. Mas logo contribuiu para evitar a despromoção do Al-Yarmouk e, na temporada seguinte, tem o seu ano de ouro no Al-Arabi.

Ante Mise, treinador do Al-Arabi e anterior treinador-adjunto da selecção nacional croata, disse que, de todos os atacantes que já tinha treinado, Dabbagh fora «o melhor de sempre».

Futebol sob ocupação

Quando o Al-Arabi recebeu o troféu de campeão, em Maio, os palestinos estavam a ser vítimas de violência em Jerusalém, na Cisjordânia, em Gaza e em Israel. Dabbagh tornou então pública uma dedicatória: «Ao meu país, a Palestina, que é difícil de quebrar. Para o meu povo que se recusa a sucumbir à humilhação, que não sabe o significado da rendição ou da derrota.»

O futebol sob ocupação raramente é simples, escreve Kieron Monks no Tribune.

Os jogos são adiados porque uma equipa fica retida num posto de controlo. O Estádio Faisal al-Husseini, sede tanto do Hilal al-Quds como da selecção nacional, teve de ser evacuado várias vezes devido ao lançamento de gás lacrimogéneo pelo exército israelita. Aos jogadores é negada autorização para viajar para o estrangeiro ou mesmo dentro da Palestina.

O companheiro de selecção nacional de Dabbagh, Salem Marabaa, faltou a jogos importantes por estar a cumprir oito meses numa prisão israelita sob «detenção administrativa» — um estatuto que permite a prisão indefinida sem acusação —, o último de uma longa lista de jogadores palestinos a sofrer o mesmo destino.

Enquanto, em Maio, hordas de linchadores patrulhavam as cidades israelitas à procura de árabes, os jogadores que viviam dentro da Linha Verde não puderam viajar para um campo de treino, e dois jogadores perderam as suas casas durante os bombardeamentos de Gaza.

A transferência de Dabbagh para o Arouca foi acordada no início de Julho, mas o jogador teve de esperar pela sua autorização de trabalho e visto para viajar para Portugal, o que não é nada fácil para alguém que nasceu em Jerusalém Oriental sob ocupação israelita.

«Todos os desportistas palestinos enfrentam desafios por causa da ocupação», diz Dabbagh. «Mas com perseverança, concentração, e enfrentando os desafios de cabeça erguida, podem concretizar os seus objectivos e os seus sonhos.»

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