A Universidade de Ariel e o Horizonte 2020: A UE está a legitimar os colonatos ilegais de Israel

Mais de meio milhar de académicos de mais de 20 países europeus, incluindo Portugal, e de Israel, subscreveram uma carta aberta em que denunciam a legitimação pela União Europeia da política de ocupação de Israel ao financiar, com fundos europeus, projectos envolvendo instituições académicas sediadas nos colonatos israelitas ilegais.

Os signatários evidenciam a contradição entre, por um lado, a reiterada afirmação pela UE de respeito pelos princípios éticos e legislações nacionais e comunitárias e do não reconhecimento da soberania de Israel sobre os territórios palestinos ocupados e, por outro lado, a falta de escrutínio ao aceitar permitir situações como a da participação da Universidade de Ariel nos projectos europeus BOUNCE e GEO-CRADLE.

Esta carta responde a um apelo do Ministério Palestino da Educação, do Conselho de Presidentes das Universidades Palestinas, da Federação Palestina de Sindicatos de Professores e Empregados de Universidades e do Conselho de Organizações Palestinas de Direitos Humanos, dirigido aos Estados, instituições académicas e organismos multilaterais de investigação, para não reconhecerem e para cessarem todas as relações institucionais com a Universidade de Ariel e com outras instituições académicas criadas ilegalmente nos territórios palestinos ocupados.

A decisão inicial de constituir a Universidade de Ariel teve a oposição do Conselho de Presidentes das Universidades Israelitas de mais de 1000 académicos israelitas alegando que «envolver a academia israelita na ideologia da conquista (…) ameaça a capacidade de funcionamento da academia».

O colonato de Ariel está situado bem no coração da Cisjordânia. Situado 3 km a norte da cidade de Salfit, fica a 22 km da fronteira de Israel, a oeste, e apenas a 30 km da fronteira com a Jordânia, a leste. O Muro do Apartheid permite criar um corredor que liga o colonato a Israel, isolando aldeias palestinas e dificultando a comunicação entre o Norte e o centro da Cisjordânia. As suas abundantes zonas verdes e piscinas são alimentadas com a água sonegada aos Palestinos.

Este é o texto integral da carta aberta:

23 de Março de 2021

Nós, académicos e investigadores abaixo-assinados em países que participam em programas de investigação europeus, registamos com grande preocupação o fracasso permanente da União Europeia em assegurar que os seus programas de investigação financiados pelos contribuintes não sejam utilizados para legitimar ou apoiar de outra forma o estabelecimento e as actividades das instituições académicas israelitas em colonatos ilegais nos territórios palestinos ocupados (TPO).

Tal como a Comissão da UE reiterou recentemente: «O artigo 19º do Regulamento-quadro do programa Horizonte 2020 prevê que todas as actividades de investigação e inovação realizadas no âmbito do programa Horizonte 2020 devem respeitar os princípios éticos e as legislações nacionais, da União e internacionais relevantes...». Foram tomadas as disposições necessárias na legislação da UE e nas suas regras de execução para «assegurar o respeito de posições e compromissos em conformidade com o direito internacional sobre o não reconhecimento pela UE da soberania de Israel sobre os territórios ocupados por Israel desde Junho de 1967».

Os critérios aplicados pela Comissão da UE para determinar a elegibilidade de projectos e participantes para apoio financiado pela UE, os termos dos seus contratos com os participantes e o seu acompanhamento das actividades e os beneficiários dos projectos devem comportar estes requisitos e os seus objectivos.

Com esta mesma finalidade, a Comissão deve também assegurar que a gestão das actividades conduzidas no âmbito de projectos de investigação financiados pela UE respeite e se coadune com o não reconhecimento pela UE da soberania de Israel sobre os TPO, o consequente não reconhecimento pela UE das entidades dos colonatos israelitas como se fossem legalmente estabelecidas e o consequente não reconhecimento pela UE das actividades baseadas nos colonatos como se fossem legalmente conduzidas.

Contudo, vários casos demonstram falhas da Comissão em dar instruções adequadas contra, controlar e rectificar as transgressões da gestão de projectos contra estas posições da UE.

A Universidade Ariel, localizada no colonato ilegal israelita de Ariel, acolheu um evento de divulgação do projecto BOUNCE em Junho de 2020 e está incluída como «parte interessada [no projecto] em Israel». Além disso, um professor da Universidade de Ariel é incluído como co-investigador no projecto, como «membro da EQUIPA BOUNCE de Israel», e como um dos «investigadores envolvidos na recolha de dados» sobre o produto do projecto, levantando sérias questões sobre se as actividades de investigação foram realizadas nos TPO.

A Universidade Ariel foi também listada como parte interessada no projecto GEO-CRADLE do programa Horizonte 2020. Foi inicialmente retirada da lista de partes interessadas na sequência de um pedido dirigido à Comissão pelo coordenador do projecto, mas o seu perfil de parte interessada foi entretanto restaurado, e no sítio web do projecto permanecem até hoje sinais do seu envolvimento.

Além disso, em todos os casos, a Universidade Ariel é falsamente indicada no material do projecto como localizada em Israel.

A agora extinta administração Trump, apoiante da extrema-direita, tornou oficial o seu apoio às instituições de colonatos israelitas ilegais, incluindo o fim das restrições de longa data ao financiamento da investigação. A UE deve e pode fazer melhor.

Órgãos de ensino superior palestinianos dignos de crédito, apoiados por académicos proeminentes, apelam às instituições internacionais para que não reconheçam a Universidade de Ariel e se abstenham de dar seguimento às suas pretensões de legitimidade institucional.

Numa altura em que a UE está a finalizar o sucessor do programa Horizonte 2020, o programa Horizonte Europa, no valor de 100 mil milhões de euros [86 mil milhões de libras esterlinas], instamos a Comissão Europeia, o Parlamento e o Conselho a conceberem, financiarem e implementarem o controlo eficaz dos projectos de investigação participantes e a responsabilizarem os transgressores.

O objectivo declarado do programa Horizonte Europa é «fornecer novos conhecimentos e soluções inovadoras para superar os nossos desafios sociais, ecológicos e económicos». Os projectos de investigação não devem ser utilizados para legitimar ou de outra forma sustentar colonatos israelitas ilegais. A UE não pode recuar nas suas obrigações a este respeito, sem reforçar a ocupação militar ilegal de Israel e a sua opressão de milhões de palestinos, e sem minar ainda mais os direitos inalienáveis e universalmente reconhecidos do povo palestino ao abrigo do direito internacional.

Para saber mais:

Texto original da carta com lista de subscritores

No Academic Business as Usual with Ariel University

Campaign Fact Sheet

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