Trinta e quatro ex-embaixadores da UE exigem acção imediata contra Israel
Numa carta aberta hoje tornada pública no EU Observer, trinta e quatro antigos embaixadores da União Europeia confrontam a UE com a sua inacção perante os crimes atrozes cometidos por Israel contra o povo palestino, e exigem-lhe acção em nome do direito internacional, da humanidade e da justiça sob pena de perder a sua credibilidade, influência e prestígio moral no mundo. Terminam enunciando nove medidas que consideram necessárias e viáveis ao abrigo do direito internacional, europeu e nacional para pôr fim a estas atrocidades.
Aos presidentes do Conselho Europeu, da Comissão Europeia e do Parlamento Europeu, e à Alta Representante para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança da União Europeia
Aos chefes de governo e ministros dos Negócios Estrangeiros dos Estados-Membros da UE
Nós, 34 ex-embaixadores da União Europeia, ficámos chocados e indignados com o massacre de israelitas inocentes e a tomada de reféns em 7 de Outubro de 2023 pelo Hamas e outros. Nenhuma causa pode justificar tais actos, e nós condenamo-los veementemente.
Hoje, porém, estamos a testemunhar o espectáculo horrível de Israel a cometer, diariamente, crimes atrozes contra o povo palestino — sobretudo em Gaza, mas também na Cisjordânia ocupada, o que equivale a uma campanha sistemática de brutalização, desumanização e deslocamento.
A União Europeia e quase todos os seus Estados-Membros não conseguiram responder de forma significativa a estes acontecimentos horríveis.
Como antigos embaixadores da UE, dedicámos as nossas vidas profissionais à defesa e promoção dos valores europeus fundamentais e do direito internacional, construindo a reputação da União Europeia e defendendo os interesses dos seus povos.
Esses interesses e essa reputação estão agora seriamente comprometidos como consequência da inacção da UE.
Cerca de 10% da população total de Gaza, incluindo dezenas de milhares de crianças, foram mortas, mutiladas e gravemente feridas pelos bombardeamentos indiscriminados das Forças de Defesa de Israel (IDF).
Há mais de 21 meses que o governo de Netanyahu tem levado a cabo uma campanha implacável de violência e destruição em Gaza. Cerca de 10% da população total de Gaza, incluindo dezenas de milhares de crianças, foi morta, mutilada e gravemente ferida pelos bombardeamentos indiscriminados das Forças de Defesa de Israel.
A maior parte de Gaza foi reduzida a escombros. Aqueles que sobrevivem às bombas e às balas enfrentam a fome, a desnutrição, as doenças e um sistema de saúde colapsado, deliberadamente alvo de Israel.
O cerco em curso está a matar a população à fome, bloqueando o fornecimento de ajuda humanitária das agências da ONU e das ONG internacionais.
Substituir a UNRWA e outros prestadores internacionais de ajuda a Gaza por uma operação de ajuda politizada e militarizada dirigida por mercenários é uma violação dos princípios humanitários da ONU de humanidade, neutralidade, imparcialidade e independência, que todos os Estados-Membros da ONU — incluindo Israel — devem respeitar na íntegra.
As medidas humanitárias concretas que terão sido acordadas no âmbito do acordo que a Alta Representante da UE, Kaja Kallas, conseguiu com Israel não foram tornadas públicas, nem o acordo foi alguma vez confirmado pelas autoridades israelitas.
Pelo contrário, desde o anúncio de Kallas em 14 de Julho, centenas de homens, crianças e mulheres foram mortos por soldados israelitas enquanto procuravam desesperadamente comida e água para as suas famílias.
Isso inclui um número alarmante de mortes de civis causadas por tiros das Forças de Defesa de Israel (IDF) em Zikim, um dos principais pontos de passagem da fronteira, que, segundo entendemos, fazia parte do acordo humanitário da UE com Israel.
Zonas de concentração
Agora, com uma previsibilidade assustadora, os líderes israelitas estão a forçar grande parte da população de Gaza a entrar em zonas de concentração — recintos militarizados concebidos para confinar civis em condições intoleráveis, com o objectivo claro de os pressionar a um deslocamento «voluntário».
Isto, juntamente com outras políticas ilegais de Israel na Cisjordânia, constitui uma transferência forçada de população, um crime de guerra grave ao abrigo do direito internacional.
Os ministros israelitas da Defesa, das Finanças e da Segurança apelaram abertamente à remoção permanente dos palestinos de Gaza, e foi criada uma «administração de migração» sénior para facilitar esse processo.
Estas são medidas calculadas no sentido da limpeza étnica.
Entretanto, na Cisjordânia, colonos israelitas violentos, com total protecção militar das Forças de Defesa de Israel, têm levado a cabo uma campanha de terror contra as comunidades palestinas.
As casas são incendiadas, os habitantes são assassinados, as famílias são expulsas, as fontes de água são envenenadas, os animais de pastoreio são roubados, os olivais são destruídos e as terras são anexadas em violação ao direito internacional.
Os perpetradores, que agem com impunidade, são armados e encorajados por funcionários do Estado. Esses colonos não são actores rebeldes — eles são os agentes da linha de frente de uma agenda impulsionada pelo governo para anexar e fazer a limpeza étnica das terras palestinas.
As provas da má conduta israelita e da sua violação flagrante de todas as leis humanitárias e de direitos humanos conhecidas são esmagadoras.
As Nações Unidas, organizações humanitárias e observadores independentes — incluindo vozes israelitas e judaicas — documentaram estes crimes em pormenor.
O Tribunal Internacional de Justiça determinou que existe um risco plausível de genocídio em Gaza e que a ocupação prolongada da Palestina por Israel não só é ilegal, como constitui um crime de segregação ou apartheid.
A opinião pública europeia e a maioria dos jovens, incluindo em países como a Alemanha e a Itália, são claramente a favor de que os seus governos ajam para pôr fim a este horror.
Congratulamo-nos com a recente condenação das acções de Israel em Gaza e na Cisjordânia por parte de 28 ministros dos Negócios Estrangeiros, incluindo 20 Estados-Membros da UE, mas as palavras não são suficientes.
Apelamos urgentemente a todos os líderes e governos da UE, especialmente aqueles que impediram o Conselho dos Negócios Estrangeiros, em 15 de Julho, de agir contra as graves violações humanitárias e dos direitos humanos por parte de Israel, para que tomem todas as medidas necessárias e viáveis ao abrigo do direito internacional, europeu e nacional para pôr fim a estas atrocidades.
As medidas devem incluir o seguinte:
1. Retomar imediatamente a entrega de ajuda internacional em grande escala e inundar a Faixa de Gaza com suprimentos humanitários, respeitando plenamente os princípios fundamentais do direito internacional humanitário.
2. Suspender com efeito imediato todas as exportações de armas e de produtos de dupla utilização para Israel.
3. Proibir o comércio com os colonatos ilegais de Israel nos territórios palestinos ocupados e proibir as relações comerciais e de investimento da UE e dos Estados-Membros com qualquer entidade ou empresa que faça negócios ou beneficie dos colonatos ilegais de Israel.
4. Suspender todos os acordos comerciais preferenciais para Israel ao abrigo do Acordo de Associação.
5. Cancelar a participação de Israel no programa Horizonte Europa e em todos os programas de investigação, académicos e tecnológicos de dupla utilização da UE.
6. Impor sanções específicas a ministros, funcionários governamentais, comandantes militares e colonos violentos israelitas responsáveis por crimes de guerra, crimes contra a humanidade, facilitação de genocídio e prática de terrorismo sancionado pelo Estado.
7. Apoiar mecanismos judiciais internacionais e nacionais — incluindo o Tribunal Penal Internacional e tribunais nacionais sob jurisdição universal — para levar os perpetradores à justiça.
8. Prestar apoio político, jurídico e financeiro às vítimas civis palestinas, aos defensores dos direitos humanos e às organizações humanitárias que operam em condições impossíveis.
9. Reconhecer o Estado da Palestina por ocasião da conferência da ONU em Nova Iorque, de 28 a 29 de Julho, para criar os pré-requisitos necessários para uma solução de dois Estados.
Em 17 de Julho, Dia da Justiça Penal Internacional, o Serviço Europeu de Acção Externa lembrou que, no que diz respeito a crimes contra a humanidade, crimes de guerra, genocídios... «a história tem demasiados momentos em que o silêncio se seguiu ao horror...».
O mundo recordará como a UE e os seus Estados-Membros responderam a esta tragédia catastrófica.
O silêncio e a neutralidade perante o genocídio constituem cumplicidade. A inacção encoraja os perpetradores e trai todos os princípios que a União e os seus Estados-Membros afirmam defender.
Ao mesmo tempo que continua a apelar incessantemente pelo regresso dos reféns, um cessar-fogo permanente e o fim da guerra, a União Europeia, há muito defensora dos direitos humanos e do Estado de direito, deve agir agora em nome do direito internacional, da humanidade e da justiça para o povo palestino — ou arrisca-se a perder a sua credibilidade, influência e prestígio moral no mundo.
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