MPPM evoca duas décadas de destruição do Médio Oriente
No mês de Março assinalaram-se 20 anos sobre a invasão do Iraque pelos EUA, Reino Unido e seus aliados, numa guerra de agressão que violou todas as normas do Direito Internacional. Também no mês de Março – que se revelou particularmente funesto para os povos do Médio Oriente – passaram 12 anos sobre o início dos bombardeamentos da NATO sobre a Líbia e sobre a intervenção na Síria por parte das potências ocidentais e seus aliados regionais. Foi ainda no mês de Março que, em 2015, teve início a agressão militar estrangeira ao Iémen.
A guerra contra o Iraque teve como pretexto mentiras sobre inexistentes armas de destruição em massa. Os bombardeamentos brutais sobre Bagdade que começaram em 19 de Março de 2003 faziam assumidamente parte da estratégia bélica de «Shock and Awe» («Choque e Temor») teorizada pelos estrategas militares norte-americanos desde a década de 90 do século XX. O Iraque foi militarmente ocupado - uma ocupação que, sob formas diversas, persiste até aos nossos dias, com a presença de cerca de 2500 soldados dos EUA, sem contar mercenários, pese embora a exigência da sua retirada pelo Parlamento iraquiano.
O Iraque já fora devastado pela guerra Irão-Iraque, a Guerra do Golfo de 1991 e uma década de brutais e mortíferas sanções da ONU que levaram à demissão de Denis Halliday e Kurt von Sponeck, dois altos funcionários da ONU, em protesto contra os efeitos criminosos das sanções para a população civil, em especial as crianças. Nos últimos 30 anos, milhões de iraquianos morreram ou foram feridos e milhões mais ficaram desalojados ou tornaram-se refugiados. A economia e a sociedade iraquianas foram destroçadas.
O Iraque ocupado tornou-se sinónimo de guerra e morte, mas também de tortura nas prisões norte-americanas como Abu Graibe. O Museu de Bagdade foi pilhado no dia da ocupação da cidade pelas tropas dos EUA, e com a sua conivência. Foram usadas armas com urânio empobrecido, cujos efeitos terríveis incluem a explosão de malformações congénitas nas gerações seguintes, como está hoje amplamente documentado.
Tentando esmagar a resistência iraquiana, as tropas de ocupação arrasaram cidades inteiras como Faluja. Um país anteriormente laico foi dividido segundo linhas confessionais e outras, dando sequência à antiga estratégia de dividir para reinar; os conflitos internos foram instigados e alimentados pelas forças ocupantes.
O martírio do Iraque é uma nódoa na imagem de uma comunidade internacional que, após anos de mortíferas sanções, procurou legitimar a ilegal ocupação através da Resolução 1483 do Conselho de Segurança da ONU (Maio de 2003). O então primeiro-ministro de Portugal, Durão Barroso, atrelou o nosso país às mentiras e crimes da invasão, acolhendo nas Lajes a Cimeira com Bush, Blair e Aznar. Foi premiado, no ano seguinte, com a sua eleição para Presidente da Comissão Europeia.
O mês de Março assinalou também os aniversários de outras guerras que devastaram o Médio Oriente.
Foi a 19 de Março de 2011 que tiveram início os bombardeamentos da NATO sobre a Líbia, numa guerra de agressão apoiada em grupos terroristas fundamentalistas que conduziu a uma fragmentação do país e desestruturação da sua soberania. E, tal como no Iraque, foi a mentira o móbil que justificou mais uma guerra. O Relatório da Comissão de Negócios Estrangeiros da Câmara dos Comuns britânica reconheceu, em Setembro de 2016, não ser verdade que o governo líbio tivesse bombardeado ou massacrado populações civis, pretexto sob o qual foi lançada a agressão da NATO.
A agressão à Líbia destruiu o país com o mais alto Índice de Desenvolvimento Humano em África (Relatórios do PNUD). Hoje, a Líbia é um país fragmentado e em guerra permanente, sujeito às manobras das potências ocidentais, que procuram impedir que esse país possa ser soberano na gestão dos seus enormes recursos energéticos.
No mesmo mês, Março de 2011, deu-se a militarização dos protestos na Síria por parte das potências ocidentais e seus aliados regionais. Esse armamento e financiamento externo, com «centenas de milhões de dólares e dezenas de milhar de toneladas de armas» foi canalizado para grupos terroristas como a Al Qaeda, como reconheceu publicamente, em Outubro de 2014, o então Vice-Presidente Biden, num encontro com estudantes da Universidade de Harvard.
Também neste caso, as potências ocidentais trouxeram a guerra, a morte, a destruição, a fragmentação, o caos, que permanecem até ao presente. Grande parte da Síria, nomeadamente a zona do país mais rica em petróleo, permanece sob ocupação pelas tropas dos EUA, em violação da sua soberania. O ex-Presidente Trump tornou claro o objectivo dessa presença ao declarar publicamente: «vamos ficar com o petróleo».
Sob ocupação permanecem igualmente uma parte do Norte do país, pela Turquia, e os Montes Golã sírios, conquistados por Israel durante a Guerra dos Seis Dias de 1967 e anexados em 1981, com reconhecimento da anexação pelos EUA durante a Presidência Trump, em violação de todas as resoluções da ONU sobre a questão. Esse reconhecimento foi mantido pelo actual Presidente Biden. Para além dessa ocupação, Israel tem lançado frequentes ataques aéreos sobre várias regiões do país, incluindo Damasco, não se coibindo de o fazer mesmo depois do sismo recente que atingiu o Norte do país.
Foi também no mês de Março, em 2015, que teve início a agressão militar estrangeira ao Iémen, por parte da Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos, mas com o apoio político e militar dos EUA, Reino Unido e outras potências, expresso também num bloqueio que tem atingido o auxílio humanitário. A guerra no Iémen, em grande medida silenciada e ignorada na comunicação social, tem sido uma enorme catástrofe humana, com centenas de milhares de mortos e com dramáticos efeitos no plano alimentar e sanitário.
Estas e outras guerras, como a ocupação do Afeganistão, ou a invasão do Líbano em 2006 e as repetidas guerras de Israel contra a população palestina sitiada na Faixa de Gaza, transformaram o Médio Oriente numa região devastada e destruída. Entre os responsáveis directos por essa situação contam-se as antigas potências coloniais, que sempre conviveram mal com a soberania conquistada pelos povos da região durante o século XX.
Os autores materiais dessas guerras de agressão, os EUA e outras potências da NATO, mostram-se hoje chocados por guerras noutras paragens. Mas é impossível esconder o seu total arbítrio no uso da força nas relações internacionais, bem como a sua responsabilidade directa pelo ataque sistemático à legalidade internacional e à soberania e integridade territorial dos países do Médio Oriente. Um arbítrio evidenciado também pelo comportamento face ao drama do povo palestino, cujos direitos inalienáveis continuam a ser ignorados após décadas de promessas nunca cumpridas e sempre violadas. Foi também este uso arbitrário da força que abriu caminho ao risco real duma catástrofe de grandes proporções, com que a Humanidade se vê hoje confrontada.
O MPPM, ao recordar estes acontecimentos das últimas décadas, volta a sublinhar que, tal como não pode haver paz no Médio Oriente sem o reconhecimento dos direitos inalienáveis do povo palestino, não pode haver paz no mundo sem haver paz no Médio Oriente. É urgente pôr fim ao caminho de guerra, de violação da soberania e direitos dos povos, de concepções coloniais e imperiais nas relações entre potências e os países da região.
4 de Abril de 2023
A Direcção Nacional do MPPM