Jornalista da Al Jazeera assassinada pelo exército israelita em Jenin
Shireen Abu Akleh, uma jornalista palestina da Al Jazeera, foi hoje morta por forças israelitas quando cobria uma rusga ao campo de refugiados de Jenin na Cisjordânia ocupada.
Shireen, 51 anos, foi alvejada no rosto, apesar de usar capacete e um colete identificativo de imprensa. Outro jornalista palestino, Ali al-Samoudi, do jornal Al-Quds, foi ferido nas costas mas encontra-se em condição estável.
A última mensagem que Abu Akleh enviou à Al Jazeera foi um e-mail às 6:13 da manhã em que escreveu: «Forças de ocupação invadem Jenin e sitiam uma casa no bairro de Jabriyat. Estou a caminho. Trago-vos notícias assim que o quadro se tornar claro».
Shatha Hanaysha, uma repórter que viajava no mesmo veículo que Shireen e Ali, disse à Al Jazeera que o exército israelita estava determinado a disparar para matar.
«Estávamos todos a usar coletes e capacetes», disse Hanaysha. «Éramos quatro jornalistas numa área exposta. Não houve confrontos ou tiros disparados por combatentes palestinos».
A Al Jazeera relatou que, segundo o chefe do seu escritório de Ramala, Walid Al-Omari, não houve tiros disparados por combatentes palestinos. Al-Omari declarou também que Abu Akleh estava a usar um capacete e foi alvejada numa área desprotegida debaixo do seu ouvido, sugerindo que isto demonstrava que ela foi alvejada deliberadamente.
A cortina de fumo de Israel
O Primeiro-Ministro israelita Naftali Bennett disse ser «provável» que a repórter da Al Jazeera tenha sido morta por tiros palestinos.
Uma fonte do exército israelita confirmou ter conduzido uma operação no início desta quarta-feira no campo de refugiados de Jenin, mas negou que tinha deliberadamente visado jornalistas: «O (exército), claro, não visa os jornalistas».
Esta versão é desmentida por Ali al-Samoudi, o jornalista da Al Jazeera que acompanhava Shireen e que também foi alvejado pelas forças israelitas, que disse não haver presença de combatentes palestinos armados no local.
«Íamos filmar a rusga do exército israelita, e de repente eles dispararam sobre nós sem nos pedirem para sair ou parar de filmar», disse ele. «A primeira bala atingiu-me e a segunda bala atingiu Shireen. Mataram-na a sangue-frio porque são assassinos e são especializados em matar apenas o povo palestino. Não houve qualquer resistência militar palestina no local.»
O que vale uma investigação israelita?
O Ministro dos Negócios Estrangeiros israelita Yair Lapid disse que Israel propôs uma investigação conjunta com os palestinos. Mas qual a credibilidade de uma investigação por Israel?
Mounir Nesseba, professor de direito internacional na Universidade al-Quds e defensor dos direitos humanos, disse à Al Jazeera que as autoridades israelitas não levam a sério as investigações, e que há poucas hipóteses de responsabilizar Israel pela morte de Shireen Abu Akleh.
«Sempre que há queixas sobre incidentes específicos sobre alegados crimes de guerra, crimes contra a humanidades ou violações do direito internacional que ocorrem nos territórios ocupados, o exército israelita não leva a investigação a sério», disse.
«Há total impunidade em Israel [e] não esperamos que Israel indicie os responsáveis".
«O TPI (Tribunal Penal Internacional) tem jurisdição na Palestina e é responsável pela investigação de crimes de guerra na Palestina. Esperamos que eles actuem neste caso».
As reacções
A deputada palestina Khalida Jarrar afirmou que Abu Akleh era a voz dos palestinos e foi morta pela «monstruosidade do colonialismo e ocupação israelitas». «Shireen foi sempre a minha voz a partir das celas da prisão. […] Shireen era a nossa voz. É inacreditável. É um crime, é tudo claro – ela foi visada de forma directa e intencional.»
O Enviado Especial da ONU para o Processo de Paz no Médio Oriente, Tor Wennesland, condenou o assassinato de Abu Akleh na Cisjordânia ocupada: «Condeno veementemente o assassinato da repórter da Al Jazeera, Shireen Abu Akleh, que foi alvejada com fogo vivo esta manhã enquanto cobria uma operação das forças de segurança israelitas em Jenin, na Cisjordânia ocupada. Apelo a uma investigação imediata e minuciosa e a que os culpados sejam responsabilizados. Os trabalhadores dos meios de comunicação social nunca devem ser visados.»
Tom Nides, o enviado dos Estados Unidos a Israel, apelou a uma investigação sobre o assassinato de Abu Akleh, que também tinha cidadania americana: «Estou muito triste por saber da morte da jornalista americana e palestina Shireen Abu Akleh. Encorajo uma investigação aprofundada das circunstâncias da sua morte e do ferimento de pelo menos um outro jornalista hoje em Jenin.»
Omar Shakir, o director para Israel e Palestina da Human Rights Watch, disse que a morte de Abu Akleh pelas forças israelitas não é invulgar: «Sabemos que as forças israelitas têm utilizado sistematicamente força excessiva», disse ele à Al Jazeera. «Este é um acontecimento que precisa de ser compreendido no contexto desta prática sistémica e dos assassínios de muitos outros jornalistas palestinos.» Shakir descreve as investigações israelitas como um «mecanismo de branqueamento».
A presidência da Autoridade Palestina denunciou o assassinato de Abu Akleh como um «crime de execução». «A presidência considera o governo israelita totalmente responsável por este crime hediondo», afirma numa declaração, que prossegue: «o assassinato de Abu Akleh faz parte da política da ocupação de atacar jornalistas para ocultar a verdade e silenciar os crimes».
O Vice-Ministro dos Negócios Estrangeiros do Qatar condenou o assassinato da repórter da Al Jazeera. Num post no Twitter, apelou ao fim do «terrorismo israelita patrocinado pelo Estado».
A Al Jazeera Media Network condenou o «assassinato flagrante que viola «leis e normas internacionais», e classificou a morte de Abu Akleh como um «crime hediondo, através do qual se pretende impedir os meios de comunicação social de cumprirem a sua missão. […] Consideramos o governo israelita e as forças de ocupação responsáveis pelo assassinato da colega Shireen.»
A Al Jazeera Media Network apelou à comunidade internacional para responsabilizar as forças de ocupação israelitas pelo «alvejamento e assassinato intencionais» de Abu Akleh.