Google e Amazon armam Israel com tecnologia de vigilância avançada

Em Maio de 2021, enquanto decorria a mais recente agressão israelita contra Gaza, a Google anunciou a assinatura do Projecto Nimbus, um contrato de computação em nuvem, no valor de mil e duzentos milhões de dólares, entre a Google, a Amazon, e o governo e os militares israelitas, que tornará mais fácil para Israel vigiar e oprimir os palestinos.

Através do Projecto Nimbus as empresas tecnológicas Google (Google Cloud Platform) e Amazon (Amazon Web Services) fornecerão ao governo e aos militares de Israel ferramentas avançadas de inteligência artificial, aprendizagem de máquina e outros serviços de computação em nuvem. O projecto também dará apoio à Israel Land Authority, a entidade responsável pela apropriação de terras e expulsão de palestinos para instalação de colonos israelitas.

Uma investigação conduzida pelo jornal digital The Intercept revela que a Google afirma que a tecnologia dará a Israel capacidades de detecção facial, categorização automática de imagens, rastreio de objectos, e mesmo análise de sentimentos que afirma ser capaz avaliar o conteúdo emocional de imagens, fala e escrita. No entanto, a Microsoft anunciou que deixaria de oferecer características de detecção de emoções através da sua plataforma de computação em nuvem Azure — um conjunto tecnológico comparável ao que a Google fornece com o Nimbus — citando a falta de base científica.

O projecto tem sido alvo de contestação por parte dos trabalhadores da Google e da Amazon que escrevem na carta que publicaram no The Guardian, em 21 de Outubro de 2021: «Condenamos a decisão da Amazon e da Google de assinar o contrato do Projecto Nimbus com os militares e o governo israelita, e pedimos-lhes que rejeitem este contrato e contratos futuros que irão prejudicar os nossos utilizadores. Apelamos aos trabalhadores da tecnologia global e à comunidade internacional que se juntem a nós na construção de um mundo onde a tecnologia promova a segurança e a dignidade para todos.»

Gabriel Schubiner, um trabalhador da Google dinamizador da campanha «No Tech for Apartheid», dirigiu uma mensagem à reunião de accionistas da empresa realizada no passado dia 1 de Junho em que propunha o abandono do projecto alegando que a Google vai «fornecer tecnologia poderosa a um exército acusado de crimes de guerra e a um governo que está a impor um sistema repressivo de apartheid».

Anteriormente, a Google abandonou outros projectos alvo de contestação como o Maven, um concurso do Pentágono para criação de algoritmos para analisar os dados do Departamento de Defesa dos EUA e que poderia ter sido utilizado para melhorar os ataques com drones. Talvez por isso, temendo sorte semelhante, Israel impôs que os centros de dados que alimentam o Nimbus residirão em território israelita, sujeitos à lei israelita e isolados de pressões políticas e a Google está contratualmente impedida de fechar os serviços do Nimbus ou de negar o acesso a qualquer gabinete governamental, mesmo em resposta a campanhas de denúncias de utilização abusiva.

«A recolha de dados sobre toda a população palestina foi e é parte integrante da ocupação», disse Ori Givati, do Breaking the Silence, um grupo de defesa anti-ocupação de veteranos militares israelitas, ao The Intercept. «De um modo geral, todos os diferentes desenvolvimentos tecnológicos a que estamos a assistir nos Territórios Ocupados apontam numa única direcção que é mais controlo».

Para Mona Shtaya, da 7amleh-The Arab Center for Social Media Advancement, uma organização que defende os direitos digitais dos palestinos, «Viver sob um Estado controlador durante anos ensinou-nos que toda a informação recolhida no contexto israelo-palestino poderia ser securitizada e militarizada. O reconhecimento de imagem, o reconhecimento facial e a análise emocional, entre outras coisas, aumentarão o poder do Estado controlador para violar o direito à privacidade dos palestinos e para servir o seu principal objectivo, que é criar entre os palestinos a sensação de panóptico que estamos a ser observados todo o tempo, o que facilitaria o controlo da população palestina».

Em entrevista ao The Intecept, Jathan Sadowski, investigador da Universidade de Monash, na Austrália, leva a preocupação para um outro nível. Ele avisa que o que a Google está a vender, em última análise, não é apenas software, mas poder. E quer seja Israel e os EUA hoje ou outro governo amanhã, algumas tecnologias amplificam o exercício do poder a tal ponto que mesmo a sua utilização por um país com um registo impecável de direitos humanos daria poucas garantias. «Dê-lhes estas tecnologias, e veja se não se sentem tentados a usá-las de formas realmente más e terríveis», disse ele. «Estas não são tecnologias que são apenas sistemas de informação neutros, são tecnologias que, em última análise, são sobre vigilância, análise e controlo».

A contestação ao Projecto Nimbus já provocou baixas. Ariel Koren, uma trabalhadora judia da Google disse, numa carta que dirigiu aos seus colegas em 30 de Agosto, que decidiu deixar a empresa: «Devido à retaliação, a um ambiente hostil e a acções ilegais da empresa, não posso continuar a trabalhar na Google e não tenho outra escolha senão abandonar a empresa no final desta semana», escreveu ela. «A Google está a ignorar a contestação generalizada, interna e pública, contra a cumplicidade da empresa na violência do apartheid de Israel através do Projecto Nimbus, e tem forçado os palestinos da empresa a sentirem-se inseguros em revelar a sua identidade no trabalho e em falar», disse Koren, acrescentando que a corporação norte-americana também tem uma «cultura de silenciar os judeus anti-sionistas».


Imagem: Alex Hinton para The Intercept

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