«Desnuclearizar o Médio Oriente, resolver o conflito israelo-árabe»

Artigo publicado em Orient XXI em 19 de Julho de 2018
 
Esta declaração, lançada por professores da universidade norte-americana de Princeton e assinada por investigadores dos dois lados do Atlântico,  pede uma ruptura com a política de Donald Trump de apoio incondicional a Israel e à região para entrar no caminho da desnuclearização, o que implica que Telavive assine o Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares.
 
O Médio Oriente está em agitação agora, possivelmente novamente à beira de uma grande guerra que poderia arrastar os Estados Unidos e a Rússia. O presidente Donald Trump retirou os Estados Unidos do acordo nuclear de seis nações com o Irão, conhecido como Joint Comprehensive Plan of Action (Plano de Acção Integral Conjunto) ou JCPOA. Embora alguns de seus conselheiros o tenham aconselhado a não sair do acordo, ele trouxe para o seu gabinete conselheiros que são conhecidos por serem intransigentes em relação ao Médio Oriente e preferirem a mudança de regimes à reforma dos regimes nessa região. O mais notável desses conselheiros é John Bolton, nomeado director da Agência Nacional de Segurança. As suas políticas alinham-se bem com as do primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, que condenou o acordo nuclear com o Irão desde o início.
Em 14 de Maio deste ano, Israel celebrou o septuagésimo aniversário da sua existência. Teve sucessos militares extraordinários contra os seus vizinhos árabes em 1948, 1956 e 1967, e depois de sofrer um revés no início da guerra de 1973 com o Egipto e a Síria, a Força de Defesa de Israel atravessou o Canal de Suez e esteve em condições de ameaçar as capitais do Egipto e da Síria e muitos dos seus centros populacionais. No entanto, apesar da sua capacidade militar sem par no Médio Oriente, das suas fortes instituições culturais, da sua capacidade tecnológica e do seu elevado nível de vida em relação aos outros Estados da região, Israel negociou acordos de paz apenas com o Egipto e a Jordânia.
O governo dos Estados Unidos forneceu imenso apoio financeiro e militar a Israel, assim como o fizeram cidadãos americanos e empresas americanas. O American-Israeli Political Action Committee (Comité da Acção Política Americano-Israelita) é um dos grupos de pressão mais fortes nos Estados Unidos, a par dos lobbies corporativos e da National Rifle Association (Associação Nacional das Armas) . A recente decisão do governo americano de transferir a sua embaixada para Jerusalém, sem obter quaisquer concessões do governo de Israel e sem o apoio de seus aliados europeus, deixa claro o apoio do governo americano ao Estado de Israel.
Igualmente importante e distintamente relacionado, talvez tão grave quanto as tensões entre o Irão e Israel, é a presença de soldados de Israel na Cisjordânia, com sua elevada população palestina. A Força de Defesa de Israel está a ocupar militarmente a região há cinco décadas,no que é uma das mais longas ocupações militares dos tempos modernos. O Estado de Israel usou o seu poder nesse domínio para negar um Estado aos palestinos, para oprimir a população palestina, para expropriar os palestinos de casas e terras, e estabeleceu uma população substancial de colonos, fortemente comprometida com a anexação destes territórios. Os decisores políticos americanos, assim como os líderes políticos israelitas, têm que repensar as suas opções políticas, militares, económicas e culturais na região. Se Israel mantiver o seu exército na Cisjordânia e continuar, com o Egipto, a isolar Gaza do mundo exterior, certamente Israel será visto como responsável pelo bem-estar das populações palestinas. Israel adoptará políticas semelhantes ao apartheid.
As elites políticas americanas e coreanas contemplaram uma desnuclearização da península coreana. Uma tal política, nomeadamente a desnuclearização do Oriente Médio, não seria um desenvolvimento que valeria a pena e um grande primeiro passo para resolver as crescentes tensões na área? Até hoje, os israelitas, possuindo, de acordo com algumas fontes, 150 ogivas nucleares e recusando-se a assinar o acordo de não-proliferação nuclear ou a permitir que a Agência Internacional de Energia Atómica realize inspecções nas suas instalações, afirmam que Israel nunca será o primeiro a introduzir armas nucleares na região. Embora os iranianos não tenham alegado que o seu programa nuclear era uma resposta à presença de armas nucleares em Israel, certamente isso deve ter sido um factor.
É tempo de que aqueles de nós que estão interessados no Médio Oriente e na paz mundial fazerem ouvir as suas vozes. Pedimos a todos que apoiem políticas que favoreçam a desnuclearização do Médio Oriente e uma resolução justa e correcta da disputa árabe-israelita.
Esta declaração teve origem na Universidade de Princeton, através de conversas envolvendo Arno J. Mayer, Stanley J. Stein e Robert L. Tignor, todos aposentados do departamento de História da Universidade de Princeton. Foi aprovada e assinada por Abdel Aziz Ezz el-Arab (Universidade Americana no Cairo), Joel Beinin (Universidade de Stanford), Noam Chomsky (MIT), Richard Falk (Universidade de Princeton e Universidade da Califórnia, Santa Barbara), Khaled Fahmy (Universidade de Cambridge), James Gelvin (UCLA), Israel Gershoni (Universidade de Telavive), Molly Greene (Universidade de Princeton), Alain Gresh (ex-editor do Le Monde Diplomatique e editor geral da Orient XXI), Chris Hedges (ex-chefe da secção de Médio Oriente do New York Times); Yoram Meital (Universidade Ben Gurion no Negev); Ralph Nader (cidadão público), Ilan Pappe (Universidade de Exeter), Vijay Prashad (Diretor do Instituto Tricontinental de Investigação Social), Roger Owen (Universidade de Harvard), Cyrus Schayegh (Universidade de Genebra), Taqadum Al-Khatib (Universidade Livre de Berlim) e Michael Wood (Universidade de Princeton) A maioria dos signatários investiga e ensina em cursos sobre o Médio Oriente moderno.
 

Os artigos assinados publicados nesta secção, ainda que, obrigatoriamente, alinhados com os princípios e objectivos do MPPM, não exprimem necessariamente as posições oficiais do Movimento sobre as matérias abordadas, responsabilizando apenas os respectivos autores.

 

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