4.º aniversário da Operação «Chumbo Fundido»

COMUNICADO 09/2012
No quarto aniversário do início da operação «Chumbo Fundido» o MPPM denuncia a continuada agressão israelita contra as populações dos territórios ocupados e convida ao reforço da solidariedade com a causa palestina.
 
Neste mesmo dia 27 de Dezembro, há quatro anos atrás, o mundo testemunhou o início de uma acção militar de crueldade sem precedentes no século em que vivemos, levada a cabo por um exército, dos mais modernos e sofisticados no mundo, sobre uma população indefesa. A operação Chumbo Fundido, assim foi baptizada pelo Estado de Israel aquela ofensiva sobre a população palestina da Faixa de Gaza, prolongou-se por vinte e três dias, e saldou-se num total de cerca de mil e quatrocentos mortos — trezentos e dezoito dos quais eram crianças — e mais de cinco mil feridos. Segundo dados das Nações Unidas, perto de seis mil e quatrocentas habitações foram totalmente destruídas ou sofreram danos estruturais profundos.
 
Organizações não-governamentais estimam em vinte mil pessoas — a grande maioria das quais refugiados — o número de pessoas desalojadas. As infra-estruturas de electricidade e água foram duramente atingidas. Instalações das Nações Unidas — entre as quais o centro de operações da UNRWA na cidade de Gaza — perto de trezentas escolas e jardins de infância totalmente ou parcialmente destruídos, hospitais e centros de saúde, mesquitas, inúmeros edifícios e serviços públicos, nada escapou à fúria dos bombardeamentos do exército israelita. Investigações ulteriores levadas a cabo no âmbito das Nações Unidas, assim como inúmeros relatos de imprensa e relatórios de diversas organizações de direitos humanos convergem na denúncia da prática de crimes contra a humanidade, entre os quais avultam o massacre deliberado de famílias inteiras — o mais grave dos quais, a família Samouni, envolvendo cerca de cem pessoas — ataques contra ambulâncias ou visando cidadãos, empunhando bandeiras brancas, e a utilização de armas com poluentes químicos, como tungsténio e, sobretudo, fósforo branco.
 
Recordar aqueles trágicos acontecimentos é, em primeiro lugar, um dever de consciência e um acto de respeito para com o sacrifício de milhares de homens, mulheres e crianças, vítimas de uma agressão brutal e indiscriminada. A evocação daqueles dias terríveis impõe, ao mesmo tempo, um exercício de reflexão sobre a continuada ocupação dos territórios palestinos, a repressão quotidiana que é infligida sobre o martirizado povo palestino e sobre a responsabilidade da comunidade internacional na perpetuação deste drama. A operação denominada Chumbo Fundido é indissociável da política de limpeza étnica da Palestina levada a cabo de forma persistente por Israel desde a sua fundação. Ela constitui, em boa verdade, um dos seus desenvolvimentos naturais. Em muitos aspectos, ela traz à memória as acções levadas a cabo pelas milícias sionistas, entre o final de 1947 e o ano de 1948, no período que a memória colectiva palestina reconhece como a Nakba (Catástrofe). Ainda assim, em muitos aspectos, o grau extremo de violência e o seu carácter massivo e indiscriminado traduziu-se numa prática de puro horror. Como as ulteriores investigações e denúncias confirmaram, os aspectos mais brutais da operação militar israelita, longe de serem explicáveis por circunstâncias particulares ou pela actuação individual de um ou outro comandante militar, corresponderam à aplicação calculada e meticulosa de um planeamento militar destinado a provocar o genocídio ou a fuga da população palestina da Faixa de Gaza. Tratou-se da aplicação do que na gíria militar israelita ficou conhecido como a doutrina Dahiya, do nome de um bairro do sul de Beirute reduzido a escombros pelos bombardeamentos israelitas levados a cabo no ano de 2006: tal como escreveram e teorizaram alguns dos generais israelitas, a operação militar configurou-se como uma acção punitiva destinada a provocar em toda a Faixa de Gaza, a exemplo daquela verificada no Líbano, o maior grau possível de destruição.
 
Mesmo assim, entre o dia 27 de Dezembro de 2008 e o dia 18 de Janeiro de 2009, a agressão de Israel contra a população da Gaza beneficiou, largamente, da compreensão e indiferença, quando não, da cumplicidade activa da generalidade dos governos europeus e, em particular, dos Estados Unidos da América. Os crimes então praticados pelo exército israelita, e profusamente documentados, as violações grosseiras de todas as convenções internacionais sobre o direito humanitário, os ataques deliberados contra as instalações das Nações Unidas permanecem sem julgamento. E o que é mais grave, a continuada ocupação dos territórios palestinos agravou-se mais ainda, a colonização intensificou-se, em especial ao redor de Jerusalém, e o bloqueio sinistro imposto por Israel sobre o território da Faixa de Gaza não deu sinais de abrandar.
 
Bem recentemente, uma nova onda de bombardeamentos de Israel sobre a Gaza, entre os dias 14 e 21 de Novembro trouxe de novo à memória os crimes que marcaram a agressão do final de 2008 e início de 2009: a mesma indiscriminada brutalidade, o desrespeito pela legalidade internacional, o mesmo desafio às Nações Unidas, o ataque deliberado contra jornalistas, tal como há quatro anos atrás. Em apenas oito dias, cerca de cento e setenta pessoas foram mortas e mais de 1030 foram feridas. Perto de mil edifícios foram destruídos ou severamente danificados, contando-se, entre eles, dez centros de saúde, trinta e cinco escolas, duas universidades, um centro de operações da UNRWA, e três cemitérios. A exemplo do que ocorrera com a operação Chumbo Fundido, a guerra serviu como instrumento de propaganda das forças políticas mais reaccionárias em Israel, ante a proximidade de eleições legislativas. Uma vez mais, a resistência heróica e determinada do povo Palestino impôs a Israel um cessar-fogo, cujos termos foram negociados com mediação do Egipto. Contudo, em várias situações desde o dia 21 de Novembro, o exército israelita violou o cessar-fogo, provocando, no conjunto, e até ao dia 21 de Dezembro passado, dois mortos e cinquenta e um feridos. Têm sido particularmente graves, a este propósito, os ataques contra as embarcações de pesca artesanal, contando-se, nesta altura, segundo dados do Centro Palestino para os Direitos Humanos, sediado em Gaza, a destruição ou confisco de 10 barcos e a prisão de mais de trinta pescadores.
 
Entretanto, no próprio dia em que era declarado o cessar-fogo na Faixa de Gaza, o exército israelita levou a cabo diversas incursões em cidades da Margem Ocidental, prendendo várias dezenas de palestinos, entre eles alguns deputados do Conselho Nacional Palestino. A acção repressiva do exército israelita na Margem Ocidental intensificou-se mais ainda, nas últimas semanas, depois da votação história na Assembleia Geral das Nações Unidas, no dia 29 de Novembro, que aprovou a elevação do estatuto diplomático da representação da Palestina na ONU. Ela foi acompanhada por anúncios sucessivos de intensificação nos planos de alargamento dos colonatos, em particular na região de Jerusalém Oriental, que, a concretizarem-se, implicariam a total inviabilização da solução de dois estados.
 
Quatro anos depois da criminosa agressão israelita sobre a população palestina da Faixa de Gaza, importa recordar, sempre e uma vez mais, que, para além da brutalidade extrema que marcou os dias da operação Chumbo Fundido ou, mais recentemente, dos bombardeamentos de Novembro último, a violência insuportável da ocupação é uma realidade incessante que continua a marcar o quotidiano das crianças e dos jovens palestinos, e que a comunidade internacional tem a responsabilidade de exigir de Israel o cumprimento da legalidade internacional e o respeito das obrigações que decorrem dos princípios da Carta das Nações Unidas. Recordar o massacre de Gaza, em Dezembro de 2008 e Janeiro de 2009, defender e respeitar a memória das suas vítimas, tem que implicar um esforço redobrado para alargar e reforçar a solidariedade com a causa nacional do povo palestino, para que, mais cedo do que tarde, a plena realização do seu direito inalienável à liberdade, com a constituição de um estado independente e soberano nos territórios que Israel ocupa desde 1967, com Jerusalém Leste como capital, seja uma realidade, e os refugiados palestinos possam, enfim, ver reconhecidos os seus direitos no espírito da resolução nº 194 das Nações Unidas.
 
Lisboa, 27 de Dezembro de 2012
A Direcção Nacional do MPPM
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