Uma centena de leis suporta o sistema de apartheid israelita
Com a aprovação de 30 novas leis pelo Knesset, desde 7 de Outubro de 2023, ascendem a cerca de 100 as leis reunidas na Base de Dados de Leis Discriminatórias do Adalah que atestam o sistema de apartheid e de supremacia étnico-nacional judaica do Estado de Israel e que reforçam e aprofundam a discriminação e repressão sobre todos os palestinos, tanto em Israel como nos Territórios Palestinos Ocupados (TPO).
O Adalah - Centro Legal para os Direitos das Minorias Árabes em Israel divulgou um novo relatório em que analisa as leis aprovadas entre 7 de Outubro de 2023 e 27 de Julho de 2025 que violam os direitos humanos fundamentais dos palestinos. As leis abrangem vários temas, incluindo a liberdade de expressão, protesto e pensamento; o direito à cidadania e à vida familiar; a igualdade e os direitos sociais; e os direitos dos presos e detidos.
Embora o Estado de Israel tenha procurado legitimar estas novas leis pelo clima político de guerra, esta legislação está enraizada na estrutura constitucional de Israel baseada na supremacia étnico-nacional judaica, que, em muitos casos, equivale a sistemas jurídicos separados para judeus israelitas e palestinos. As leis reflectem e são a manifestação da «Lei Básica: Israel como Estado-nação do povo judeu», de 2018.
Tendências legislativas
Uma das tendências detectada é a utilização generalizada do quadro antiterrorista que, na prática, é aplicado quase exclusivamente aos cidadãos palestinos de Israel e aos residentes palestinos de Jerusalém Oriental. As definições vagas de «acto terrorista» e «organização terrorista» na Lei Antiterrorista de 2016 e nas alterações subsequentes tornaram-se ferramentas fundamentais para suprimir a liberdade de expressão dos palestinos, especialmente desde Outubro de 2023.
Outra tendência canaliza enormes recursos estatais para reservistas israelitas-judeus em novos privilégios — impostos, bem-estar, ensino superior e benefícios de emprego — que, pela sua natureza, excluem os cidadãos palestinos de Israel a quem está vedado o acesso ao serviço militar.
Destaca-se ainda a institucionalização de medidas de emergência temporárias, repetidamente renovadas ou tornadas permanentes, permitindo violações generalizadas dos direitos dos detidos e condições punitivas contra prisioneiros palestinos mantidos sob custódia israelita.
Negação do direito à liberdade de expressão, pensamento, crítica e protesto
Cinco leis restringem severamente os direitos à liberdade de expressão, opinião e protesto: (i) criminalizam o consumo de conteúdos mediáticos produzidos por designadas «organizações terroristas»; (ii) proíbem expressões que as autoridades considerem negar a versão oficial do Estado sobre os acontecimentos de 7 de Outubro de 2023; (iii) concedem ao Ministério da Educação ampla discricionariedade para demitir professores e cortar o financiamento a escolas por expressões que considere constituírem apoio ou identificação com «actos de terrorismo», «organizações terroristas» ou como «incitamento ao terrorismo»; (iv) proíbem a entrada em Israel de cidadãos estrangeiros por declarações críticas sobre as acções do Estado ou por recursos a tribunais internacionais; e (v) restringem as transmissões de canais de comunicação social críticos com base em alegados «danos à segurança do Estado».
Negação do direito à cidadania, à vida familiar e aos laços comunitários entre os palestinos
Neste âmbito foram aprovadas três novas leis que: (i) permitem a deportação de famílias palestinas consideradas como «famílias de terroristas»; (ii) ampliam a proibição existente à reunificação familiar palestina e impõem medidas mais severas para a entrada «ilegal» em Israel; e (iii) impõem penalidades mais severas para quem alojar, transportar ou empregar palestinos dos TPO sem autorização.
Negação sistemática das garantias de julgamento justo e violação dos direitos dos presos
(i) Importação de poderes antiterrorismo para o direito penal: Nos últimos anos, o Estado recorreu a medidas de segurança e militarização para controlar as populações nas cidades e aldeias palestinas dentro de Israel, introduzindo nova legislação e importando medidas anteriormente reservadas ao combate ao terrorismo, sob o pretexto de combater as elevadas taxas de criminalidade.
(ii) Violações dos direitos processuais dos detidos e prisioneiros palestinos: (a) negação de acesso a um advogado por longos períodos de tempo; (b) participação em processos penais apenas por videoconferência ou por telefone; (c) detenção prolongada sem acusação de suspeitos em casos relacionados com a segurança; (d) Lei dos Combatentes Ilegais que concede às autoridades israelitas amplos poderes para detiver indivíduos indefinidamente sem acusação, julgamento ou condenação, através de ordens de detenção de seis meses que podem ser renovadas indefinidamente com base em provas secretas.
(iii) Violações dos direitos dos presos: (a) condenação a penas de prisão de crianças a partir dos 12 anos de idade; (b) consolidação da discriminação entre presos: exclusão de prisioneiros de segurança da libertação administrativa e licenças; (c) institucionalização da superlotação extrema das prisões: presos forçados a dormir em colchões no chão; (d) punição de presos por «obstruir» um agente prisional
Negação de direitos sociais e aprofundamento das desigualdades na alocação de recursos
As leis são de dois tipos:
(i) Utilização dos benefícios de assistência social como ferramenta de punição colectiva em que benefícios como subsídios de doença e de invalidez, complemento de assistência, subsídios de desemprego, subsídios por nascimento e pensões, são retirados a indivíduos suspeitos, acusados ou condenados por crimes relacionados com a segurança ou a terrorismo, e, em alguns casos, às suas famílias;
(ii) Aprofundamento da desigualdade na educação com a concessão de benefícios como a admissão prioritária em alojamentos estudantis, apoio financeiro directo, outros benefícios e concessões académicas ao longo de seus estudos ou o financiamento integral dos cursos por três anos (ou quatro anos em certas áreas, incluindo engenharia e medicina), exclusivos para soldados dispensados todos concedidos exclusivamente com base no serviço militar — a que a grande maioria dos cidadãos palestinos de Israel não tem acesso — independentemente da necessidade socioeconómica
Cessação das operações da UNRWA nos TPO
Em 28 de Outubro de 2024, o Knesset promulgou duas leis anti-UNRWA com o objectivo de encerrar qualquer actividade da UNRWA (Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados da Palestina no Próximo Oriente) e proibir a cooperação entre a agência e as autoridades israelitas.
A Lei para o Encerramento das Actividades da UNRWA no Estado de Israel, de 2024, estabelece que a UNRWA não poderá estabelecer qualquer representação, prestar quaisquer serviços ou realizar quaisquer actividades, directa ou indirectamente, dentro do «território soberano do Estado de Israel».
A Lei de Cessação das Actividades da UNRWA, 2024, rescinde imediatamente o convite à UNRWA com base numa troca de cartas de 1967 entre Israel e a UNRWA e proíbe qualquer funcionário israelita de manter contacto com a UNRWA ou o seu pessoal.
Projectos de lei pendentes
Além das leis aprovadas, há projectos de lei em discussão no Knesset que prejudicariam ainda mais a participação democrática e a igualdade dos palestinos. Entre outros, há projectos de lei para (i) facilitar a desqualificação de partidos e candidatos árabes do Knesset; (ii) proibir a contratação de professores com diplomas de instituições académicas palestinas; (iii) demitir funcionários universitários com base em opiniões políticas; (iv) consolidar a anexação da Cisjordânia por meio de mudanças jurisdicionais, e (v) tributar o financiamento de governos estrangeiros a ONG de direitos humanos. Está também em discussão um projecto de lei para aplicar a pena de morte a quem matar um cidadão israelita por «racismo ou hostilidade para com o público», «com o objectivo de prejudicar o Estado de Israel e o renascimento do povo judeu na sua pátria».